por A. Oliveira das Neves
Economista, Presidente da Direcção do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE)
Uma breve retrospetiva das tendências recentes e das necessidades de intervenção dos territórios rurais evidencia o carácter limitativo das abordagens da política de desenvolvimento rural, sob enquadramento da Política Agrícola Comum, para promover o desenvolvimento destes territórios:
• Tendências recentes [despovoamento dos espaços rurais e envelhecimento das populações que condicionam qualquer esforço de revitalização das economias locais; estreitamento crescente dos recursos do território (equipamentos educativos, serviços de saúde, oferta de transportes e comunicações, estabelecimentos comerciais, …); e quebra acentuada das dinâmicas de animação económica nos territórios rurais que reflete uma menor capacidade de empreendedorismo e investimento endógeno, mas também uma menor atração de investimento exógeno, não permitindo capitalizar investimentos efetuados, p.ex., na melhoria da qualidade de vida e na conservação do património rural].
• Necessidades de intervenção [estruturação das fileiras agroalimentar e florestal, contribuindo para a integração dos produtores primários na cadeia de valor (sistemas de qualidade, valorização dos mercados locais, …); transferência de conhecimento e inovação, com acesso a informação técnica, produtiva e de mercado, por parte dos agentes dos sistemas socioeconómicos agrorurais; organização das produções primárias e criação de respostas de comercialização que reduzam os elos de dispersão da cadeia de valor dos produtos e serviços dos territórios rurais; refuncionalização de equipamentos de saúde, educação e cultura disponíveis, através da oferta integrada (fixa e itinerante) de serviços públicos diferenciados, podendo contribuir para a melhoria da qualidade de vida, a sustentabilidade de limiares de ocupação humana, a fixação e a atração de população e de atividades económicas].
O enquadramento destas necessidades territoriais de intervenção reflete, em certa medida, o conflito tradicional à mesa do orçamento comunitário entre a política de desenvolvimento rural e a política de coesão, que concentram a maior parte dos recursos do Orçamento da União Europeia.
Os termos de conflito são bastante objetivos: equidade territorial vs. eficácia redistributiva, e abordagem integrada vs. abordagem sectorial. E as soluções têm oscilado entre uma maior directividade do nível comunitário e alguma margem de manobra “concedida” aos Estados‑Membros e construída no terreno das abordagens de desenvolvimento territorial.
Relativamente às dualidades descritas, o Relatório Barca (Comissão Europeia, 2009) é taxativo quanto às vantagens das políticas de desenvolvimento serem concebidas tendo em conta a dimensão territorial, na justa medida em que o território constitui fator de eficácia, um valor/objetivo que não decorre da simples justaposição de investimentos sectoriais.
Em nosso entender, a densidade dos problemas em presença e a heterogeneidade das necessidades de intervenção, deixa a claro a necessidade de fazer convergir de forma racional e coerente: (i) a política de desenvolvimento rural (que adquiriu particular centralidade em sucessivas gerações de programação do FEOGA-O e do FEADER); (ii) as políticas sectoriais, na sua aproximação aos territórios (dimensão relevante para as Regiões Convergência, na afetação regionalizada dos Programas temáticos/sectoriais que abrangem, p.ex., os sistemas de incentivos às empresas); e (iii) as políticas de coesão que dispõem de instrumentos de intervenção e de recursos de financiamento (nomeadamente, via FEDER e FSE) especialmente relevantes para investir na melhoria das condições de desenvolvimento. Esta última vertente comporta diversos domínios de investimento, com destaque para: (i) Investimentos materiais (infraestruturas de pequeno porte, equipamentos sociais e outros); (ii) Investimentos económico-produtivos (investimentos empresariais em ramos de atividade económicanão apoiados pelo FEADER que apoia, sobretudo, investimentos na agricultura e no agroalimentar); e (iii) Conhecimento e Competências (I&D e formação para a qualificação de ativos).
A referida convergência dinâmica beneficia de orientações promissoras de enquadramento comunitário para mobilização dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento, orientações que visam potenciar complementaridades e sinergias entre instrumentos de política no contexto da programação plurifundos, uma abordagem sem tradição relevante na programação dos Fundos Estruturais em Portugal.
O conhecimento existente dos conteúdos dos projetos de Programas Operacionais (PO) Regionais e também do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente (PDR) não reflete uma apropriação efetiva das possibilidades abertas por aquelas orientações de enquadramento dos principais Fundos, sendo disso exemplo:
• a dotação especifica para a Abordagem Leader que deveria mobilizar recursos de financiamento (FSE e FEDER, nomeadamente, em vista da concretização da Prioridade 6 do FEADER Promover a inclusão social, a redução da pobreza e o desenvolvimento económico das zonas rurais, com especial incidência nos seguintes domínios) viabilizando um recurso sinérgico a estes Fundos da Política de Coesão, no âmbito de Estratégias Locais, está circunscrita ao financiamento FEADER, o qual tem um centramento acentuado em intervenções de matriz agrícola, pequena transformação e comercialização;
• os PO Regionais contemplam uma aproximação às abordagens de desenvolvimento territorial integrado de carácter muito genérico, não explicitando conteúdos (prioridades, objetivos, tipologia de operações, …) para além do quadro geral constante do Acordo de Parceria, não abordando, no patamar da programação, ideias e propostas interessantes em matéria de valorização económica dos recursos endógenos e de desenvolvimento dos territórios de baixa densidade que constavam, p.ex., dos Planos de Ação Regional;
• os PO Regionais programam dotações financeiras bastante limitadas para Prioridades de Investimento que enquadram, ao nível das NUT II, importantes políticas sectoriais para os territórios, p.ex., nos domínios dos Objetivos Temáticos (OT) 4, 5, 6 e 7 (questionando o verdadeiro impacto de intervenções com reduzida dotação de recursos em domínios como a valorização do património natural e cultural, a preservação dos recursos naturais, a mobilidade sustentável, …) e nos objetivos ligados ao desenvolvimento do Potencial Humano (OT 10) e à Inclusão Social e Emprego (OT 8 e 9) em que à reduzida dotação financeira acresce uma elevada subordinação às necessidades de financiamento das políticas educativa e de proteção social, sem concomitante territorialização dos respetivos objetivos;
• os PO Regionais e, também, o PDR e o PO Temático Inclusão Social e Emprego têm uma abordagem do Desenvolvimento Local de Base Comunitária (DLBC) desprovida de compromissos em matéria de governação das áreas de atuação e dos contributos de financiamento, não aprofundando as implicações da matriz plurifundos da programação, nem clarificando mecanismos de organização de candidaturas, de apresentação das mesmas, de análise e seleção de projetos, etc. Neste contexto, relativamente inesperado e predatório do aproveitamento de oportunidades de programação, consideramos indispensável recuperar alguns princípios-chave da abordagem da problemática do desenvolvimento rural- -local que poderão contribuir para salvaguardar um património de intervenção indispensável à valorização social e económica dos territórios rurais:
• assentar as intervenções nos diversos contextos territoriais em instrumentos de planeamento estratégico de desenvolvimento;
• desenvolver abordagens de carácter integrado, concebendo projetos competitivos e sustentáveis, em articulação com outros instrumentos de desenvolvimento territorial;
• valorizar intervenções de carácter temático, criando mais-valias sobre o território e potenciando o perfil de recursos existentes;
• aproveitar e dinamizar a proximidade territorial, relacional e de conhecimento, como base de estruturação de recursos e instrumentos de atuação em prol do desenvolvimento rural;
• promover a inovação social como instrumento-chave do desenvolvimento sustentável e da adequação permanente de respostas às novas necessidades, no quadro de uma nova responsabilização das pessoas e organizações na vida económica e social (condição de revitalização dos territórios);
• potenciar a capacidade reconhecida das ADL na intermediação entre atores públicos, privados e associativos a qual assenta na experiência acumulada em processos de aprendizagem que têm ligado organizações e pessoas, num mesmo território, na construção de soluções que respondem a interesses e necessidades comuns.
Todavia, a afirmação destes princípios-chave carece de alianças formais e substantivas tanto no período de programação/negociação dos instrumentos de financiamento dos investimentos que possam responder às necessidades de intervenções dos territórios, como na fase de gestão e implementação dos mesmos. Nessa ótica de construção de capacidade de iniciativa e de criação de valor para os territórios, importa dar conteúdo formal e substantivo aos seguintes instrumentos:
• Versões finais dos PO Regionais, que devem consagrar um modelo de intervenções DLBC que explicite compromissos das instâncias intervenientes (locais, regionais e nacionais/ setoriais) em matéria de complementaridades entre as Prioridades de Investimento e de financiamento plurifundos delimitando as fronteiras de intervenção ao nível dos critérios e princípios orientadores da seleção das operações.
• Modelo de governação dos diferentes Programas, que deve acautelar, nas condições operativas de suporte aos processos de tomada de decisão, a existência de modalidades de participação formal e de coresponsabilização dos parceiros intervenientes aos diversos níveis da governação.
• Conceção e implementação dos Pactos para o Desenvolvimento e Coesão Territorial, em curso de preparação sob responsabilidade das Comunidades Intermunicipais (CIM – NUT III), influenciando as dinâmicas de criação e desenvolvimento de empresas, de promoção da empregabilidade e de valorização dos recursos endógenos.
• Elaboração de Estratégias de Desenvolvimento Local, nomeadamente, por iniciativa dos Grupos de Ação Local (GAL) e de Grupos de Ação Costeira (GAC), que estabeleçam soluções de base territorial norteadas pela eficácia de articulação de intervenções e complementaridades de investimento procurando valorizar as capacidades de animação territorial reveladas.
Artigo de opinião publicado em Julho de 2014, no Jornal Pessoas e Lugares Nº 16.
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A ELARD, constituída por redes nacionais de desenvolvimento rural, congrega Grupos de Ação Local gestores do LEADER/DLBC de 26 países europeus. A MINHA TERRA foi presidente da ELARD no biénio 2018-2019. |
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O livro “Receitas e Sabores dos Territórios Rurais”, editado pela Federação Minha Terra, compila e ilustra 245 receitas da gastronomia local de 40 territórios rurais, do Entre Douro e Minho ao Algarve.
[ETAPA RACIONAL ER4WST V:MINHATERRA.PT.5]