2023-05-08
Morreu Vítor Barros, ex-Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural nos governos de António Guterres, tendo sido responsável pela criação das equipas de Sapadores Florestais. Era presidente da Assembleia Municipal de São Pedro do Sul desde 2013.
Engenheiro Agrónomo de carreira, Vítor Barros tinha 72 anos.
Um grande defensor do desenvolvimento rural e dos processos de Desenvolvimento Local que os Grupos de Ação Local, com o programa LEADER foram implementando ao longo dos últimos 30 anos.
Alguém que foi capaz de olhar para os territórios do interior, como merecedores das mesmas oportunidades que o resto do país, Vitor Barros pautou a sua vida por uma forte intervenção cívica em defesa dos processos de desenvolvimento participados.
Endereçando um voto de pesar e de solidariedade a toda a família e amigos, a Federação Minha Terra homenageia-o com a republicação da entrevista que deu ao primeiro número do Jornal Pessoas e Lugares, em junho de 1999.
I Encontro Nacional da Célula de Animação da Rede Portuguesa do LEADER II
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O Desenvolvimento Rural em Portugal
Entrevista com o Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural Engenheiro Vítor Manuel Coelho Barros
Pessoas e Lugares - A Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural foi criada no início da presente legislatura. O Senhor é o seu segundo titular. Após este período de pouco mais de 3 anos, que balanço faz?
Vitor Barros — A Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural, tutela, por delegação do Ministro da Agricultura do Desenvolvimento Rural e das Pescas, serviços tão importantes para o desenvolvimento rural como a Direção Geral de Desenvolvimento Rural, a Direção Geral de Florestas, o Instituto de Hidráulica, Engenharia Rural e Ambiente e o Serviço Nacional Coudélico e programas tao reconhecidamente importantes como as Iniciativas Comunitárias LEADER e INTERREG - Agricultura e Desenvolvimento Rural. Nos três últimos anos foi feito um esforço acentuado no sentido de, por um lado, dar corpo e fundamentação a uma política de desenvolvimento rural, em conformidade com os princípios e orientações expressas no Programa do Governo e, por outro lado, aplicar e fazer aplicar as novas orientações numa ótica mais dinâmica e numa perspetiva mais ajustada às preocupações e necessidades dos agentes do desenvolvimento.
É neste contexto que podemos citar, a título exemplificativo, o seguinte conjunto de ações favoráveis à concretização dos objetivos estabelecidos: resolução dos estrangulamentos financeiros do LEADER e arranque do mesmo para uma situação de estabilidade e de dinamismo; reformulação do programa de medidas agroambientais e consequente aumento significativo dos apoios associados ao mesmo; reformulação da legislação do turismo em espaço rural; ajustamento dos dispositivos de aplicação dos apoios aos Centros Rurais/PPDR e consequente aprovação dos respetivos Planos Globais de Intervenção; reforço das ações no domínio da promoção de produtos de qualidade; regularização e consolidação da aplicação da medida de apoio à formação profissional agrária; aprovação da Lei de Bases da Política Florestal e do Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta Portuguesa; aprovação do Programa de Ação Nacional contra a Desertificação; revisão do regime jurídico de fomento, exploração e conservação dos recursos cinegéticos; apoio à implementação e execução de programas de desenvolvimento integrado (AVNA, PROALENTEJO-PEDIZA,...); dinamização e reforço das ações no domínio do regadio, da eletrificação das explorações agrícolas e dos caminhos rurais e, ainda, ajustamento dos dispositivos de aplicação dos apoios às organizações de agricultores. Reconhece-se porém que nem tudo o que foi planeado foi realizado em tempo oportuno e da melhor forma. Isto porque nem sempre foi possível ultrapassar estrangulamentos originados por opções políticas do anterior Governo. São disso exemplo algumas limitações impostas pela programação associada ao II Quadro Comunitário de Apoio para o período 1994-99.
PL. - Em sua opinião, até que ponto a existência desta nova Secretaria influiu na evolução da sensibilidade e compreensão do pessoal do Ministério em geral para a problemática do desenvolvimento rural, sobretudo no que se refere à distinção entre desenvolvimento rural e desenvolvimento agrícola elou agrário?
Em primeiro lugar é imprescindível precisar as questões. A nova estratégia para a agricultura portuguesa funda-se numa aliança sólida e dinâmica entre a agricultura e o desenvolvimento sustentável dos territórios rurais na tripla vertente ambiental, económica e social e para o efeito foram definidos um conjunto de objetivos operacionais, entre os quais salientamos: o reforço da competitividade económica e da multifuncionalidade das explorações agrícolas, a promoção da qualidade e da inovação da produção, a melhoria das condições de vida e de trabalho dos agricultores, o apoio à organização, associação e iniciativa dos agricultores, a valorização do potencial específico dos territórios rurais e o seu desenvolvimento e diversificação eis e regionais; no segundo aspeto, é de sublinhar o destaque que tem vindo a ser dado à problemática do território e das zonas rurais quer ao nível dos apoios financeiros quer no que concerne ao envolvimento dos serviços do Ministério em ações de natureza integrada. Esta é aliás uma via que pretendemos aprofundar e consolidar. Os serviços do Ministério tenderão a ser cada vez mais serviços de apoio ao desenvolvimento rural, onde a agricultura tem um papel importante e muitas vezes decisivo.
PL.- Quais são os obstáculos ou incompreensões que ainda subsistem para a necessidade da integração de políticas nacionais de desenvolvimento rural que visem criar programas com lógicas territoriais e integradas, com execução autónoma por parcerias locais, financiadas por linhas orçamentais da responsabilidade de diferentes Ministérios?
A lógica do desenvolvimento sustentável e integrado está presente em todas as reflexões sobre as medidas e os instrumentos de política de apoio ao desenvolvimento agrícola e rural, podendo dizer-se o mesmo em relação a todas as áreas de intervenção do Governo. No entanto é necessário reconhecer que a obediência a esta lógica não tem sido sempre fácil. Em primeiro lugar, porque as lógicas de programação ao financiamento comunitário não têm incentivado e facilitado a adoção de procedimentos integrados; em segundo lugar, porque ao nível dos departamentos ministeriais ainda não se alcançou uma total coordenação e articulação de interesses, sendo de notar que a prática dos governos anteriores era claramente contrária a este objetivo; em terceiro lugar porque a lógica de sustentabilidade e integração pressupõem a aplicação de princípios de coesão e de solidariedade entre territórios, sectores e agentes ainda não completamente reconhecidos e assumidos.
Os trabalhos de programação em curso para aplicação em 2000-2006 apoiam-se nesta lógica quer no que se refere aos eixos de intervenção nacionais quer relativamente aos eixos de intervenção regionais, assumindo-se como referência a coesão económica e social como preocupação dominante da ação politica no contexto do processo de transformação estrutural da sociedade portuguesa.
PL.- Em sua opinião o desenvolvimento rural é, ou não, também desenvolvimento local? Se sim, porquê chamar-lhe apenas desenvolvimento rural sem referência alguma ao nível de proximidade territorial que a sua prática exige?
É óbvio que o desenvolvimento rural é também desenvolvimento local, no entanto necessário não esquecer que todo o desenvolvimento rural é desenvolvimento local, mas nem todo o desenvolvimento local é desenvolvimento rural. Há políticas de desenvolvimento local que têm objetivos predominantemente urbanísticos. Este entendimento está aliás presente quer na Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo, quando se especifica que o regime de uso do solo é definido em primeiro lugar mediante a classificação do mesmo em solo rural e solo urbano, quer na regulamentação da mesma lei que prevê que os Planos de Pormenor Municipais podem adotar a forma de "Projetos de intervenção rural". Isto não significa porém que só se entenda que as políticas de desenvolvimento rural apenas devem inadir sobre os solos rurais. O Ministério da Agricultura tem uma visão mais abrangente e integradora do desenvolvimento rural, onde nomeadamente são considerados os núcleos populacionais – “aldeias” – como polos de dinamização do desenvolvimento económico e social.
PL. - Considerando que as iniciativas e práticas de desenvolvimento local em meio rural no nosso país têm sido marcadas pelo programa de iniciativa comunitária LEADER, e estando agora a finalizar-se o LEADER II, quais sio as mais-valias que aponta para aquela intervenção?
Como já tivemos oportunidade de reconhecer em diversas ocasiões as iniciativas comunitárias LEADER I e II contribuíram de forma clara pata a viabilização de numerosas e importantes comunidades locais. Esta viabilização, assente na valorização dos atores e no aproveitamento das potencialidades locais e nas sinergias entre setores e atividades, traduziu-se num valor acrescentado que podemos sintetizar da seguinte forma: criação e consolidação de uma rede de competências diversificadas e ajustadas aos problemas do desenvolvimento rural; apresentação e concretização de projetos de desenvolvimento inovador e promoção de iniciativas geradoras de emprego; dinamização do trabalho em parceria e consequente compatibilização de interesses potenciando sinergias e dinâmicas sociais e económicas; implementação de procedimentos participativos e de responsabilização dos agentes do desenvolvimento e conceção e aplicação de um sistema de gestão descentralizado, simples e flexível.
PL. - Sabendo-se que o programa LEADER II passou a cobrir praticamente todo o território rural português sem que os meios financeiros afetados tenham tido um aumento correspondente, retirando por isso intensidade e visibilidade no terreno ao trabalho esforçado de muitos grupos locais gestores do programa, como antevê o futuro da nova iniciativa LEADER + para o período 2000/2006?
O LEADER I abrangeu cerca de 40% do território e o LEADER II alargou essa cobertura a quase 80% de Portugal. Uma das problemáticas que se impõe clarificar relativamente ao futuro do LEADER respeita à sua aplicabilidade em termos territoriais. Como se sabe a revisão da legislação comunitária de enquadramento da Politica Agrícola Comum, decidida em Berlim em março passado, acolhe, de acordo com as propostas formuladas na Agenda 2000, o desenvolvimento rural como segundo pilar da PAC estabelecendo que o FEOGA poderá financiar a "promoção da adaptação e do desenvolvimento das zonas rurais". O novo posicionamento da União relativamente ao desenvolvimento rural reflete-se igualmente no quadro do financiamento da iniciativa LEADER para o período 2000-2006, uma vez que o mesmo passa a ser assegurado integralmente pelo FEOGA-Orientação. Neste contexto afigura-se lógico e natural que a generalidade das zonas rurais venha a ser apoiada no âmbito do Programa de Desenvolvimento Regional, nomeadamente através de medidas e ações propostas em matéria de agricultura e desenvolvimento rural, e que as zonas rurais mais desfavorecidas venham a ser apoiadas complementarmente. e de forma particular, através do LEADER, Esta filosofia, baseada na necessidade de compatibilizar e dar coerência aos vários instrumentos de politica com incidência nos territórios rurais, no entender do MADRP, deve ser equacionada na seguinte perspetiva: aplicação de critérios fundamentados na definição das zonas de intervenção do LEADER; conceção e aplicação de um sistema de gestão balizado pelos princípios da simplicidade e da transparência; envolvimento da generalidade dos agentes económicos e sociais, em particular daqueles que representam de forma mais acentuada os interesses dos sectores produtivos das zonas rurais: adoção de métodos de seleção rigorosos quer no que se refere aos grupos de ação local quer relativamente à seleção das intervenções e projetos a apoiar. Os meios financeiros a disponibilizar pela União não deverão colocar qualquer dificuldade na concretização destes objetivos.
PL.- Seria ou não necessário e oportuno potencializar a exemplaridade da dinâmica LEADER, dotando o desenvolvimento local, em meio rural, com programas de iniciativa nacional, financiados pelo QCA e pelo Estado Português?
Como se referiu atrás os exercícios de programação em elaboração para o 2000-2006 desenvolvem-se num quadro regulamentar mais adequado ao desenvolvimento das zonas rurais, na medida em que se projetam atuações potencialmente mais coerentes e integradas. Por outro lado o Governo já traçou algumas orientações relativamente ao Programa de Desenvolvimento Regional que apontam por um lado para um reforço da componente a gerir regionalmente, por outro lado para a necessidade de serem acolhidas as ações integradas de base territorial e finalmente para a adoção de mecanismos de programação e gestão que acautelem a integração das estratégias de desenvolvimento propostas pelos vários sectores. Estas orientações estão em completa concordância com os princípios estabelecidos pela União Europeia no sentido de reforçar a componente regional a garantir a maior eficiência e eficácia na utilização dos recursos. Neste quadro de referência assistir-se-á cada vez mais acentuadamente a um reforço dos programas de âmbito regional e local, onde se deverá integrar a componente rural, sem prejuízo da manutenção de programas nacionais para situações particulares com incidência em zonas com problemas específicos distribuídas por todo o território.
PL. - Na actividade de animação com os grupos LEADER temos verificado que estes reforçaram a sua capacidade de intervenção no terreno e até a própria especificidade do LEADER. Mas também encontraram dificuldades de coordenação que tem a ver com problemas de harmonização entre os programas dirigidos ao mundo rural. Como vê esta harmonização? O que está a ser feito neste sentido?
Como já se referiu uma das preocupações presentes no desenvolvimento dos trabalhos de programação para o período 2000-2006 é acautelar uma aplicação articulada e coerente das medidas e dos instrumentos para promoção e desenvolvimento das zonas rurais.
Esta articulação e coerência está a ser analisada e considerada, quer ao nível da fixação dos objectivos quer no que se refere aos aspectos técnicos de caracterização das intervenções e da concepção do sistema de gestão.
A concretização deste objectivo encontra-se fortemente dependente das soluções adoptadas no âmbito da cooperação e da parceria. O MADRP tem vindo a desenvolver esta vertente quer através de relações interinstitucionais quer no quadro do envolvimento dos agentes económicos e sociais. É necessário continuar a trilhar este caminho e é imprescindível que os agentes compreendam e assumam uma posição apropriada neste domínio. A experiência do LEADER I e II é extremamente positiva relativamente a esta matéria e temos as mais justificadas expectativas de que os princípios da cooperação e a parceria venham a ser aplicadas de forma ainda mais abrangente e eficaz na preparação do LEADER para o período 2000-2006.
Entrevista publicada no número zero do Pessoas e Lugares – Jornal de Animação da Rede Portuguesa LEADER II, em Junho de 1999.
Documentos Anexos:
Recorte da Entrevista - Pessoas e Lugares n.º 0/Junho de 1999
Terra Viva 2019A 3.ª edição do programa Terra Viva da Antena da TSF deu voz e ouvidos a 54 promotores e promotoras de projetos, beneficiários da Medida LEADER do PDR2020 através dos Grupos de Ação Local do Continente, entre os dias 3 de junho e 9 de julho de 2019. |
ELARD
A ELARD, constituída por redes nacionais de desenvolvimento rural, congrega Grupos de Ação Local gestores do LEADER/DLBC de 26 países europeus. A MINHA TERRA foi presidente da ELARD no biénio 2018-2019. |
54 Projetos LEADER 2014-2020 Repertório de projetos relevantes e replicáveis apoiados no âmbito da Medida 10 LEADER do Programa de Desenvolvimento Rural 2020 elaborado pela Federação Minha Terra. |
Cooperação LEADEREdição da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural e Federação Minha Terra, publicada no âmbito do projeto “Territórios em Rede II”, com o apoio do Programa para a Rede Rural Nacional. |
Agenda |
Webinário de boas-práticas sobre habitação nas áreas rurais |
2025-02-20, Evento online |
O livro “Receitas e Sabores dos Territórios Rurais”, editado pela Federação Minha Terra, compila e ilustra 245 receitas da gastronomia local de 40 territórios rurais, do Entre Douro e Minho ao Algarve.
[ETAPA RACIONAL ER4WST V:MINHATERRA.PT.5]