2023-03-20
A avaliação enquanto prática ou rotina de gestão é quase um dilema existencial da nossa sociedade. Refletir sobre os aspetos críticos do desempenho é algo embaraçador porque expõe as fragilidades e receios e aumenta a desigualdade politicamente incorreta. Não se deseja avaliar porque o receio da má figura é superior ao mérito advindo de um eventual bom desempenho. Trata-se de uma exposição que, quando não rejeitada, será preferencialmente evitada. Avalia-se o menos possível e de preferência, os aspetos mais simples, facilmente quantificáveis e politicamente corretos.
A avaliação do programa LEADER tem-se centrado na avaliação de desempenho das estratégias de desenvolvimento local (EDL). Os aspetos de governação dos Grupos de Ação Local (GAL) na implementação das estratégias têm sido avaliados, mais por inerência da avaliação das estratégias do que por qualquer outro motivo uma vez que estas dimensões não têm sido escalpelizadas nos aspetos críticos do modelo de governação do programa LEADER. De fato, as boas avaliações que têm sido produzidas submetem-se a um caderno de encargos cujo objetivo é responder às premissas de avaliação das políticas públicas que pretendem salvaguardar o bom planeamento dos organismos intermédios, dos estados membros e a própria Comissão Europeia/DG AGRI. Os resultados das avaliações não contemplam a questão essencial de perceber a democraticidade do modelo de governação sobre o qual toda a pertinência dos GAL assenta e cuja filosofia vive dos processos de desenvolvimento local. A densidade analítica necessária para empreender esta avaliação implicaria mecanismos próprios com indicadores complexos e pressupostos desfasados do período de programação.
Parece assim haver um receio, das partes envolvidas, de incluir de forma robusta um quadro de desempenho do modelo LEADER, em todas as suas dimensões que realce todos os seus aspetos, sendo esta constatação uma constante desde que programa LEADER existe.
Ao longo das sucessivas versões do programa Leader o mainstreaming surgiu mais como uma consequência de reforma da Política Agrícola Comum (PAC) do que uma evolução da mesma pois a intenção de partida seria contagiar a PAC pelo LEADER, quando o que se passou foi o seu contrário. Isto é, hoje a abordagem LEADER submete-se aos critérios de avaliação dos Progrmas de Desenvolvimento Rural (PDR) e de todo o 2º pilar da PAC, não tendo qualquer especificidade de avaliação. Esta consequência leva a que os indicadores de planeamento, de avaliação ex ante, são em tudo idênticos às do restante programa operacional. Trata-se de uma perda inequívoca que se traduz na incapacidade de realçar a sua especificidade.
A incapacidade de criar e adotar indicadores criativos e necessariamente complexos para a abordagem LEADER tem sido realçada e debatida. Mas o fato é que o enquadramento do planeamento de um programa nacional uno implica a adoção dos mesmos princípios e da sua racionalidade interna. Este será talvez o ponto de partida do erro central do problema de como avaliar e explicar o LEADER. Há indicadores abundantes mas que não retratam os efeitos da intervenção Leader.
De fato, o LEADER, na aceção ampla implica a adotação de sete princípios de um modelo de intervenção aos quais deve ser adicionado um pressuposto que é descurado implicitamente na programação: o tempo. Fazer desenvolvimento local em meio rural implica tempo, um tempo quase indeterminado. Desenvolvimento é um processo e não apenas a soma de um conjunto de projetos, citando Goulart Carrilho. As suas interligações são complexas e interdependentes, focadas num público-alvo que corresponde às populações desfavorecidas e subdesenvolvidas do país, aqui e em toda a europa.
Ora a União Europeia tem sido incapaz de travar o êxodo rural sendo evidente que se trata de um fenómeno transversal a toda a Europa rural. Portanto, surge aqui o primeiro paradoxo: Se o Leader é um programa diferente que requer uma interpretação ajustada ao mundo rural, como se pode esperar medir os seus efeitos com os instrumentos de medida iguais ao de qualquer outro programa? E um segundo: como se pode exigir resultados de causalidade num tempo reduzido quando o tempo é indeterminado e decorrente dos processos de intervenção?
Adicionalmente, o combate à pobreza esta aqui implícito. Existe êxodo rural porque existe tendência para maior concentração de pobreza nestes territórios. Apesar de existir pobreza nos meios urbanos, a pobreza dos meios rurais traduz-se num PIB per capita inferior em termos comparativos. Assim, os meios rurais padecem de maiores índices de pobreza, regressão populacional e envelhecimento por comparação com os meios urbanos.
Será então razoável ou lógico pedir e julgar que um pequeno subprograma responda às mesmas premissas que as que não são asseguradas pelos milhares de milhões de euros de outros programas de caracter macro? Qual a pertinência destes serem repetidos? Qual será o seu custo benefício?
O sucesso e a capacidade dos GAL, agora questionados ao abrigo de lógicas pouco claras de reorganização territorial, podem ser comparadas ao investimento massivo noutras estruturas como as CCDR, as CIM, ou no passado as Agências de Desenvolvimento?
Estas questões, absolutamente críticas na conceptualização das avaliações do LEADER, não têm sido capazes de ser desmitificadas desde a primeira iniciativa comunitária.
Eficiência e eficácia dos programas
Estas questões levam-nos a refletir sobre a eficiência e a eficácia do programa LEADER. Será o programa LEADERE eficiente? À luz dos indicadores e limitando a análise a uma relação causal entre os indicadores criados de avaliação das EDL e os seus resultados, poderemos dizer que cumpre. No entanto, cumpre tanto quanto qualquer outro programa, e eventualmente a um custo superior. Cumpre num alinhamento normal sem qualquer tipo de distinção que a sua conceptualização original merece, e sobre este aspeto nada será mais errado do que omitir este fato.
Intervir nos territórios rurais, os mais desfavorecidos, enfim, os menos desenvolvidos, tem custos incomparavelmente superiores comparativamente aos territórios densamente povoados, com crescimento económico e emancipação social das suas comunidades.
Os meios rurais não permitem a otimização de recursos por diversas razões pois a sua escala mínima é crítica e tendencialmente indicia tendências de declínio. Portanto não há lugar à otimização administrativa nem económica. Como pode haver ganhos de escala neste contexto?
Os censos de 2021 evidenciam uma perda acentuada de população, em particular nos territórios rurais onde a atividade agrícola, pouco organizada, predomina. A novidade desse declínio neste intervalo censitário é que mesmo em regiões mais competitivas, mas de cariz rural, essa perda também se verificou, embora menos acentuadamente, mas com o mesmo fim à vista.
Portanto, importa afirmar que serão necessários mais recursos para os meios rurais em todos os programas, e não apenas na abordagem LEADER, que é manifestamente incapaz de responder ao desafio societal do êxodo rural.
Quanto à eficácia poucos serão os programas mais capazes. A perenidade dos projetos fala por si. As bases de transformação socioeconómica das zonas de intervenção do LEADER são hoje as âncoras de desenvolvimento gulosamente adotadas pelas outras políticas públicas com intervenção em meio rural. A transformação levada a cabo pelo LEADER é maior que o seu legado quantificado em número de projetos, empregos, empresas e fixação da população, e menos ainda sobre o montante financeiro que disponibilizou. Será com certeza um múltiplo desses indicadores todos.
Os GAL têm sido incapazes de chamar a si o mérito deste efeito multiplicador, uma vez que a sua essência e boa vontade, uma opacidade típica de uma filosofia de bem comum, produz esquecimento, omissão, e nesse processo, não tem sido evidenciada a eficácia do seu trabalho. Uma eficácia que só pode ser medida no prazo das intervenções todas, desde 1991, e não apenas de uma intervenção programática duns curtos 6 ou 7 anos.
Atrevo-me a dizer que este legado não existe em qualquer outro programa, em particular nos programas operacionais que a cada momento mudam e que não evidenciam qualquer coerência no tempo, em particular quando se analisa a relação custo benefício. Ao contrário os tostões executados no LEADER foram transformados em milhões e o seu impacto significativo traduz-se nalgum estancar da sangria do meio rural. Poderá outro programa ter tanto impacto com tão pouco dinheiro?
José Coutinho, LEADER OESTE
Terra Viva 2019A 3.ª edição do programa Terra Viva da Antena da TSF deu voz e ouvidos a 54 promotores e promotoras de projetos, beneficiários da Medida LEADER do PDR2020 através dos Grupos de Ação Local do Continente, entre os dias 3 de junho e 9 de julho de 2019. |
ELARD
A ELARD, constituída por redes nacionais de desenvolvimento rural, congrega Grupos de Ação Local gestores do LEADER/DLBC de 26 países europeus. A MINHA TERRA foi presidente da ELARD no biénio 2018-2019. |
54 Projetos LEADER 2014-2020 Repertório de projetos relevantes e replicáveis apoiados no âmbito da Medida 10 LEADER do Programa de Desenvolvimento Rural 2020 elaborado pela Federação Minha Terra. |
Cooperação LEADEREdição da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural e Federação Minha Terra, publicada no âmbito do projeto “Territórios em Rede II”, com o apoio do Programa para a Rede Rural Nacional. |
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Webinário de boas-práticas sobre habitação nas áreas rurais |
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O livro “Receitas e Sabores dos Territórios Rurais”, editado pela Federação Minha Terra, compila e ilustra 245 receitas da gastronomia local de 40 territórios rurais, do Entre Douro e Minho ao Algarve.
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