30 anos de LEADER: Testemunho de Luís Capoulas Santos

Iniciativa "Desenvolvimento Local em Portugal - Uma História Contada na Primeira Pessoa"

Luís Capoulas Santos, Ministério da Agricultura / Assembleia da República

Como antigo funcionário do Ministério da Agricultura, desde sempre comprometido com o desenvolvimento rural, tive o privilégio de participar no lançamento da abordagem LEADER em Portugal e de, mais tarde, como Secretário de Estado e Ministro, a oportunidade de tomar algumas decisões que a ampliaram e reforçaram.

Passadas três décadas o balanço é francamente positivo, pese embora todas as vicissitudes e acidentes de percurso que, aqui ou ali, possam ter ocorrido. Numa fase inicial, foi necessário combater a desconfiança da Administração em geral, peranteum a abordagem em que os principais atores deixavam de ser os técnicos do ministério em detrimento de agentes da sociedade civil. Foi uma etapa difícil, de adaptação e progressiva consolidação, mas bem sucedida, que permitiu, a partir de 1996, alargar o numero de GAL – Grupos de Ação Local e o aumento da abrangência territorial, estendendo o programa, pela primeira vez, às regiões autónomas.

A aparente reserva da Administração tinha alguma razão de ser, dada a pouca expressão da sociedade civil organizada, a ausência de experiência de trabalho em rede, bem como as suspeitas de aproveitamento de controlo politico local face a estas fragilidades. O Programa LEADER, porém, acabou por se impor progressivamente e tornou-se, tanto quanto é hoje possível percecionar, praticamente consensual quanto ao seu contributo relevante para o desenvolvimento local.

Os problemas do dia-a-dia foram, porém, muitos, para os principais agentes deste novo instrumento de desenvolvimento, em particular para o pequeno exército de jovens e motivados quadros técnicos qualificados que tiveram de confrontar-se com a precariedade e a instabilidade profissionais decorrentes da lentidão dos procedimentos burocráticos, dos estrangulamentos financeiros, particularmente nos períodos de transição dos quadros comunitários de apoio, cuja angústia partilhei tantas vezes com sentimento de impotência.

É, por isso, justo, saudar e reconhecer os esforços e sacrifícios de tantos empreendedores locais e de técnicos e dirigentes dos GAL aos quais o mundo rural e o país muito devem.

Não tenho acompanhado com muito detalhe o enquadramento do LEADER neste novo período de programação que está prestes a começar, mas as parcas informações de que disponho não deixam de me causar preocupação. Qualquer eventual redução de áreas de atuação ou do envelope financeiro provocarão sérias consequências negativas, desperdiçarão experiência longamente acumulada, porão em causa uma abordagem abrangente de desenvolvimento, para além de limitação de capacidades das ADL- Associações de Desenvolvimento Local e de redução dos seus quadros técnicos, invertendo, paradoxalmente, a orientação do governo de fixação de quadros nas regiões com maiores constrangimentos sócio económicos.

Faço votos para que a abordagem LEADER continue a desempenhar o papel positivo que lhe é reconhecido ao longo das ultimas três décadas, mas, sobretudo, pelo muito que há ainda a fazer em prol do desenvolvimento do mundo rural que continua a padecer de graves estrangulamentos estruturais que as atuais tristes circunstâncias históricas que vivemos agravam.

Estou certo de que o bom senso prevalecerá e que um novo e positivo ciclo se iniciará já a partir do próximo ano. A parte do país onde mergulham as nossas mais profundas raízes culturais precisa e agradece.