Grupos de Acção Local: 30 anos a envolver as comunidades nas políticas públicas

2023-11-23

Por Miguel Torres

Os GAL cumprem uma função de mediação entre actores públicos e privados que nenhuma outra estrutura cumpre a nível local, sendo este o principal factor de diferenciação.

Não existe nenhuma outra política pública em que a comunidade seja tão envolvida no seu desenho, implementação e avaliação, como o instrumento Desenvolvimento Local de Base Comunitário.

O Ministério da Agricultura e Alimentação (MAA), fez sair por estes dias uma notícia sobre os resultados de um apoio à renovação do parque de tractores. Sem desvalorizar aimportância da notícia e do apoio a que diz respeito há, contudo, uma informação que, provavelmente por lapso, não é referida na nota divulgada.

Este apoio resulta de 54 avisos de concurso lançados em simultâneo, sendo 53 deles lançados pelos Grupos de Acção Local (GAL) no quadro das suas estratégias de desenvolvimento local (EDL), e um aviso nacional para fazer face a territórios não cobertos pela intervenção dos GAL.

E porque é que é importante realçar este pormenor?

Os GAL representam parcerias territoriais com uma fortíssima relação com os diferentes actores locais numa lógica de capilaridade das relações que, desde há mais de 30 anos, é um elemento característico do seu modelo de intervenção.

Na lógica de parceria que os GAL sempre defenderam e vão continuar a defender, pois são actores privilegiados para fazer chegar as políticas públicas mesmo àqueles que não sabem que a elas têm direito, abriram estes avisos de concurso por proposta da Autoridade de Gestão do PDR2020, com uma dotação total de 30 milhões de euros a que se juntaram mais 5 milhões para os territórios não cobertos pela intervenção dos GAL.

Nos resultados deste processo fica patente a importância da proximidade aos territórios e aos promotores, pois nos 53 avisos de concurso promovidos pelos GAL, a procura por parte de potenciais beneficiários superou largamente as disponibilidades orçamentais iniciais, exigindo um reforço de dotação por forma a acolher as candidaturas merecedoras de mérito na sua avaliação. No aviso de carácter nacional, em que não houve intervenção dos GAL, a procura por parte de promotores ficou longe da oferta inicial do aviso. Fica uma vez mais claro que o papel dos GAL na mobilização e acompanhamento dos promotores nos respectivos territórios de intervenção é uma forma fundamental de garantir o acesso aos apoios.

Tal como referido na nota do MAA este apoio é importante para os pequenos agricultores. A renovação deste parque de máquinas vai ter enorme influência sobre a segurança e melhoria das condições de produção da pequena agricultura. Garantir que todos tinham acesso a ela, foi o compromisso de todos os GAL.

O MAA afirma também na sua nota que esta medida faz parte de um caminho a ser consolidado até à plena execução do PDR 2020 (Programa de Desenvolvimento Rural do Continente), no qual os GAL reafirmam estar muito empenhados. Sabemos, no entanto, que há condições externas aos promotores de projectos que colocam dificuldades a esta mesma execução. Sendo a mais relevante o facto de os beneficiários das medidas de apoio canalizadas pelos GAL serem provavelmente os mais frágeis do sistema de incentivos e que estão neste momento, fruto de múltiplas circunstâncias, a enfrentar enormes desafios para a concretização dos seus projectos. E a execução do programa depende da sua capacidade de implementação.

A metodologia que os GAL aplicam nos respectivos territórios de intervenção há mais de 30 anos e que decorre nos diferentes quadros comunitários do Programa Leader, por extenso “Ligação entre Acções de Desenvolvimento da Economia Rural”, nasceu em 1991 para abraçar a causa do desenvolvimento de zonas rurais, recorrendo a uma abordagem ascendente, valorizadora de comunidades e recursos locais. Face à diversidade das zonas rurais, criou-se um instrumento para o desenvolvimento local alicerçado em sete pilares essenciais, interdependentes e complementares: estratégias locais de desenvolvimento; concepção e implementação ascendente das estratégias; parcerias locais entre entidades privadas e públicas, materializadas nos Grupos de Acção Local (GAL); acções integradase multissectoriais; inovação; cooperação e ligação em rede.

Estes princípios que os GAL aplicam diariamente desde 1991 são os que nos permitem pensar, em conjunto com os territórios e os seus actores, estratégias de desenvolvimento local que resultam de amplos debates com a participação de parceiros públicos e privados, colectivos ou individuais, representativos dos mais diversos sectores. É uma metodologia que visa co-construir com os intervenientes, intervenções multissectoriais, valorizando a diversidade e as especificidades de cada território com apostas em sectores tão diversos, mas complementares, como a agricultura, o turismo, a educação, o empreendedorismo, a criação de emprego, etc. tendo como matriz de base a aposta na inovação, no capital social e na melhoria da governança.

Foi esta metodologia que levou à constituição dos Grupos de Acção Local que foram a primeira experiência de trabalho intermunicipal com resultados comprovados, e que hoje tão valorizada é no quadro da implementação das políticas publicas através das Comunidades Intermunicipais. Os GAL cumprem uma função de mediação entre actores públicos e privados que nenhuma outra estrutura cumpre a nível local, sendo este o principal factor de diferenciação.

Podemos afirmar com grande convicção que não existe nenhuma outra política pública em que a comunidade seja tão envolvida no seu desenho, implementação e avaliação, como o instrumento Desenvolvimento Local de Base Comunitário (DLBC) que enquadra a intervenção dos GAL. Desvalorizar isto é desperdiçar um capital de experiência quetem permitido uma profunda transformação dos territórios onde se tem aplicado.

Não deixa de ser interessante que esta questão surja no momento em que está a decorrer, em Portugal continental, o processo de reconhecimento dos GAL, respectivas parcerias e territórios de intervenção.

Estas 52 parcerias territoriais apresentaram candidaturas ao reconhecimento, representando mais de 3000 organizações e indivíduos que ao longo de vários meses participaram em centenas de sessões/debates locais/regionais sobre a construção da estratégia a adoptar em cada território.

Estratégias construídas tendo por base o quadro definido pelo Plano Estratégico para a Política Agrícola Comum 2023 – 2027 (PEPAC) e que contrariamente ao que era desejado pelos GAL e pelos territórios que representam, deixou de prever intervenções multifundo (com recurso também ao FEDER e FSE), para passar a ter unicamente financiamento FEADER (agrícola) tentando “empurrar” estas parcerias para intervenções exclusivas nesta área, em claro antagonismo com as orientações internacionais e as aprendizagens do programa e metodologia Leader.

Apesar disso, continuamos a acreditar no modelo que aplicamos há décadas, e continuamos a posicionar-nos como parceiros dos diferentes organismos do Estado, para garantir a todos o acesso às políticas públicas que se lhes destinam, ajudando a cumprir um dos fundamentais desígnios do Estado democrático, cujo 50.º aniversário nos preparamos, todos, para celebrar.

Artigo originalmente publicado no Jornal Público no dia 12 de Novembro de 2023


Terra Viva 2019


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A 3.ª edição do programa Terra Viva da Antena da TSF deu voz e ouvidos a 54 promotores e promotoras de projetos, beneficiários da Medida LEADER do PDR2020 através dos Grupos de Ação Local do Continente, entre os dias 3 de junho e 9 de julho de 2019.

ELARD

 

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A ELARD, constituída por redes nacionais de desenvolvimento rural, congrega Grupos de Ação Local gestores do LEADER/DLBC de 26 países europeus. A MINHA TERRA foi presidente da ELARD no biénio 2018-2019.

54 Projetos LEADER 2014-2020

 
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Repertório de projetos relevantes e replicáveis apoiados no âmbito da Medida 10 LEADER do Programa de Desenvolvimento Rural 2020 elaborado pela Federação Minha Terra.

Cooperação LEADER


Edição da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural e Federação Minha Terra, publicada no âmbito do projeto “Territórios em Rede II”, com o apoio do Programa para a Rede Rural Nacional.





[ETAPA RACIONAL ER4WST V:MINHATERRA.PT.5]